A vida é assim? Nunca mais e ponto?
Temos de apagar o passado, aceitar, deletar, abstrair, sobreviver… mas era eu, fui eu ali, e agora já não posso ser mais o que fui ?
Ha fatos que temos de aceitar. Nunca mais seremos crianças, nunca mais veremos no outro a paz que a infância permite. O “colo” é coisa pra “nunca mais”…
Adolescência também passa, a onipotência sedutora de imaginar o mundo a seu serviço passará, e nunca mais a vida terá tanta musica e leveza …
O primeiro beijo, o primeiro emprego, a primeira viagem, o primeiro orgasmo, o primeiro filho, o primeiro apartamento, enfim… tudo se perderá no tempo e portanto, nunca mais será a primeira vez. Aprende- se a negar as perdas paulatinas, dos dias que roubam as possibilidades de algo novo de novo acontecer.. cada vez menos a vida acontece. E talvez por isso eu pensei que “nunca mais” era fato!
Talvez por isso fui aceitando o aperto no coração como doença crônica da alma. De qualquer alma. Da alma humana.
Dito isso, conto rápido meu encontro com Sophia. Uma senhora de mais ou menos oitenta anos que conheci no metrô, nosso encontro durou exatos quinze minutos, mas me rasgou as aceitações. Sentou ao meu lado no banco do vagão do metrô, me observou ..acho, e então me disse que eu não estava ali. Na cara dura, assim, me cutucou o braço enquanto eu olhava meu próprio reflexo pelo vidro escuro da janela, e disse isso. Uma louca, pensei, a olhei querendo me afastar . Um segundo depois percebi que ela disse a verdade, eu não estava ali. Mas qual o problema? Porque teria de estar?. Ela continuou: “Onde você está? Sabe? “
Eu sabia, estava pensando no que nunca mais seria, estava enterrando os ossos por dentro.. ela disse: “Vá viver menina!”
Eu não me sentia uma menina aos 41 anos, e ela era apenas uma velha intrometida , engoli a resposta.
Ela continuou: “crie novas primeiras vezes, vá, corra, rápido, ainda dá tempo. “
Ela então se levantou, disse sorrindo que aquele era o conselho da velha Sophia e se foi.
E agora estou aqui pensando: nunca mais tanta coisa.. e ainda tenho novas? Tenho?…. Sophia acabara de subverter meus conceitos para aceitar o “nunca mais”, aceitar, temos de aceitar o que findou e ponto.
Após o ponto, ainda se tem mais? … Ah! Se eu pudesse perceber além do meu próprio reflexo nos vidros escuros das janelas. Passado e futuro se misturam agora na minha cabeça, .. e a voz de Sophia grita por dentro : Vá viver, menina!
Escrita por Adriana Borba W.
12 Comentários
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